Ciência da linguagem
Muitas pessoas sabem o que é ciência e muitas pessoas sabem o que é linguagem – algumas podem não conhecer profundamente os dois conceitos ou tê-los estudado a fundo, mas não são palavras desconhecidas ou com circulação pouco comum. O que poucas pessoas têm a oportunidade de saber é que esses dois termos podem um ser complemento do outro, ou seja, que ciência e linguagem podem compartilhar um significado em comum.
Mesmo quando estamos numa faculdade específica, seja estudando Epistemologia em um curso de Física ou estudando Linguagem em um curso de Letras, a concepção de que a linguagem pode ser estudada cientificamente ainda é bastante limitada. Vejamos o fato de que há grande aceitabilidade de chamar a disciplina Física de ciência, o que não acontece com a disciplina de Português.
No conceito atual de ciência, os pesquisadores costumam delimitar um objeto de estudo em particular. Ainda usando nosso exemplo, um físico não pode ser capaz de estudar sobre todas as leis do Universo da matéria e da energia; há físicos que estudam partículas subatômicas, há físicos que estudam o movimento dos planetas, há físicos que estudam as trocas energéticas entre os objetos etc. Isso também acontece com a Linguística: o termo linguagem possui uma área muito ampla de significação; há linguistas que estudam como o cérebro aprende uma nova língua, há linguistas que estudam como a política é posta no discurso, há linguistas em estudam como se consegue o efeito de humor em um texto etc. Em especial, alguns desses linguistas trabalham com seu objeto de estudo da mesma maneira como os físicos fazem: cientificamente.
Falemos dos linguistas que estudam a sintaxe das línguas naturais. Seu objeto de estudo deve ser delimitado e eles pesquisam a constituição sintática daquilo que as pessoas falam. Sendo sintaticista, então, quando este profissional se deparar com a sentença “Tá muito calor”, o fato de esta sentença poder representar uma indireta de alguém que queira ligar o ar-condicionado não faz parte do seu escopo de pesquisa. O sintaticista vai olhar para a sintaxe dessa língua e não para as possibilidades diversas de significado dela, que levam em conta questões interiores de cada falante.
Além disso, como pesquisador, o sintaticista não pode alterar seu objeto. Se ele ouviu “Tá muito calor”, ele não pode fingir que ouviu “Está muito calor” ou fazer essa “correção” arbitrariamente. Também seria impensável dizer que seu objeto de estudo está errado – é preciso que o pesquisador observe os fenômenos da língua tal qual eles se manifestam, sem ignorar nenhuma sentença!
Uma vez definido seu objeto, é preciso levantar questões, como “Como são essas sentenças?” e “Por que elas se manifestam assim e não de outra maneira?”. Se uma sentença qualquer pode ter sido dita, é porque o caminho inverso pode ser refeito e sua forma de realização pode ser estudada. Mais do que isso, através da observação das sentenças da língua, encontramos um determinado padrão que poderá servir como uma hipótese sobre como outras sentenças futuras poderão ser formadas. Com esses ingredientes, é possível construir um modelo teórico para a linguagem!
Aí está: e você tinha pensado que Português era só decorar um monte de regras de acentuação? Continue navegando no Clickideia e aprenda como o modelo teórico da Gramática Gerativa pode responder à pergunta sobre como fazer ciência com linguagem.