A globalização
Vimos que depois da Segunda Guerra Mundial começa a ocorrer a internacionalização do capital produtivo, e uma nova divisão internacional do trabalho passa a delinear-se. Chegamos aos anos 1980, e nesta década a situação tornava-se clara: a maior parte da riqueza mundial concentrava-se na mão das grandes empresas transnacionais.
De outro lado, os Estados desenvolvidos descobriam-se financeiramente arruinados, incapazes de continuar bancando as demandas sociais, como assistência médica, educação, aposentadoria, etc. Era, enfim, o esgotamento do Estado do Bem-Estar Social, ou Welfare State e a afirmação do neoliberalismo. A estratégia de produção das grandes empresas internacionais já não atendia mais às suas aspirações de lucro e ampliação do capital; a partir de então, a lucratividade passa a ser conseguida através de vantagens sobre a concorrência – eis a era da competitividade. Tal prática exigiu que as empresas passassem a oferecer produtos mais baratos e de melhor qualidade; tornando-se necessário que se minimizassem os custos de produção – através de avanços tecnológicos, além de menores preços por matérias-primas e mão-de-obra trabalhadora.
Assim, os avanços tecnológicos, especialmente nas comunicações e nos transportes, permitiram que as transnacionais pudessem produzir e operar em diversos pontos do planeta, decompondo o processo produtivo e dispersando suas atividades por lugares onde fossem oferecidas melhores condições em relação a custos operacionais.
Estamos nos referindo à chamada estratégia global de fabricação: a produção deixa de ser local para ser global, e o que vem nessa esteira é também a tendência à mundialização do consumo, uma vez que o que é fabricado em inúmeros lugares também é consumido em diversos pontos do mundo. Os fluxos econômicos se intensificam com uma velocidade assustadora, e fica cada vez mais difícil detectar em qual lugar foi produzido tal produto, o que acaba por transformar completamente a divisão internacional do trabalho. A internacionalização do capital passa a abarcar quase todo o planeta e se intensifica cada vez mais, o que nos descortina a fase contemporânea da história: a globalização. A globalização é caracterizada pela mundialização do ciclo reprodutor do capital, isto é, pela mundialização da produção, circulação e consumo das mercadorias, qualquer que seja ela. É por isso que torna-se tão importante a “eliminação das barreiras entre os países”, para que o dinheiro e as mercadorias possam circular cada vez mais livremente; daí vem o discurso de que o Estado não tem mais poder, que está se tornando obsoleto. Na verdade, o que acontece é que houve uma transfiguração do papel do Estado; ele perde poder diante das grandes empresas porque legisla a favor delas, isto é, o Estado não faz mais o papel de provedor da sociedade; ele legou essa obrigação à iniciativa privada, ao mesmo tempo em que serve de regulamentador do espaço, para que as empresas possam operar mais eficientemente.
Buscando uma competitividade cada vez mais agressiva, as empresas financiam cada vez mais o avanço das tecnologias, mecanizando e robotizando os objetos, o que resulta num aumento crescente do desemprego, em nível mundial. A globalização não é apenas sentida na economia; ela permeia tudo, a cultura, a política, a ciência, e, sobretudo, a informação.
Três agências de notícias, entre inúmeras outras, decidem quais as informações que serão difundidas pelo mundo; a cultura se mundializa e se massifica de tal forma que as pessoas ao redor do mundo, em geral, vestem-se da mesma maneira, ouvem o mesmo tipo de música, comem o mesmo tipo de comida e divertem-se de modo semelhante (em shopping-centers, computadores, etc); há que se perceber que tudo isso advém dos valores que hoje são escolhidos para basear a sociedade: o consumo, o utilitarismo, o individualismo. Para finalizar, uma observação importante:
A globalização, ao contrário do que diz sua mídia, não tem a tendência de homogeneizar o espaço, de torná-lo tão integrado que se possa falar de uma aldeia global. Muito pelo contrário. A globalização é extremamente seletiva, não está no mundo todo de fato; quando ela se instala, se instala em lugares específicos, selecionando certas atividades e beneficiando certos grupos em detrimento do resto.
É dessa forma que podemos afirmar que apenas alguns lugares do mundo são globalizados e não todo ele; e a parte que fica fora dela é a parte excluída, marginalizada. Então a globalização, em sua verdadeira face, serve para aprofundar as desigualdades, concentrando ainda mais as riquezas, aumentando as diferenças entre os países e dentro deles, tornando o espaço geográfico ainda mais heterogêneo.
A globalização se apresenta como fábula, sendo, na verdade, uma perversidade, que não exclui, entretanto, a possibilidade de se tornar uma outra globalização: veja belíssimo texto de Milton Santos sobre esse assunto clicando aqui!