Fordlândia, o Brasil de carona na indústria automobilística
É senso comum atualmente a tese de que a quantidade de automóveis nas ruas é diretamente responsável por algumas das principais mazelas das grandes cidades: trânsito caótico, poluição sonora e atmosférica, stress, acidentes e violência. A popularização do automóvel tem seus contras. Porém, embora o fenômeno pareça muito recente, esta popularização se iniciou ainda no início do século passado nos Estados Unidos. E o Brasil teve uma pequena participação nisso.
Nas primeiras décadas do século 20, o nome "Henry Ford" era conhecido quase que no mundo inteiro. Empresário empreendedor, ele concebera em 1913 um novo sistema de produção industrial posto em prática na sua fábrica de automóveis. O Fordismo, como ficou conhecido, consistia na divisão racionalizada das etapas de fabricação distribuídas ao longo de uma linha de montagem. Assim, uma esteira automatizada era responsável por transportar as peças do veículo em produção por todas as etapas da fabricação, compostas por um operário que repetia uma mesma operação padronizada por todo o dia de trabalho. Esse sistema promovia uma maior produção de veículos num tempo consideravelmente menor, o que gerava aumento da oferta de automóveis no mercado americano e a redução do preço, consequentemente tornando este bem mais acessível. Outra característica do Fordismo era a verticalização da fábrica, o que consistia na incorporação de todas as demandas de produção. Desta forma, a Ford passou a ser não apenas uma montadora de veículos, mas a cuidar também da fabricação do aço, vidros e pneus que compunham seus carros, tornando-se independente de fornecedores e das variações bruscas do mercado de matéria-prima. É nesse contexto que Henry Ford voltara os olhos para a região Norte do Brasil, mais especificamente para uma região ribeira do estado do Pará.
Com a aquisição das terras por concessão do governo paraense, Ford iniciou o projeto de criar sua fábrica de látex própria, de modo a suprir a demanda para fabricação de pneus, antes dependentes de produtores da Malásia governados pelo império britânico. Desse modo, surgia a chamada “Fordlândia”, onde foram plantadas mudas de seringueira para a produção da borracha. O contingente de trabalhadores contava com a adesão gradual de migrantes vindos principalmente da região Nordeste do Brasil.
Porém, o que parecia ser um investimento próspero desde o início se mostrou bastante problemático. Primeiramente foi o solo, que, ao contrário do que se projetava, era infértil e pedregoso na região. Além disso, o sistema de plantio das seringueiras não foi executado da melhor forma, o que deu origem ao aparecimento de pragas agrícolas. Em seguida, vieram os problemas com os trabalhadores que, desacostumados com a alimentação tipicamente norte-americana oferecida nos refeitórios e principalmente com o rigor disciplinar das chefias, abandonavam os postos ou envolviam-se em motins.
Diante das adversidades, Ford ainda tentou transferir a fábrica para outra região do estado, na cidade de Belterra, que oferecia estalagens mais adequadas e condições de solo mais favoráveis. Em pouco tempo, porém, o desenvolvimento tecnológico permitiria a fabricação da borracha a partir de derivados do petróleo com custo bem menor, inviabilizando a continuidade do projeto. E o Brasil estacionava por algum tempo na história dos automóveis.