WikiLeaks: uma nova forma de política
O mundo do jornalismo nunca mais será o mesmo. Assim como o universo dos documentos confidenciais de várias nações do mundo, inclusive e principalmente dos Estados Unidos, que deverá sofrer sérias modificações: o nível de segurança utilizado para guardar tais dados se tornará uma preocupação central durante um bom tempo, quebrando a cabeça de muitos técnicos sobre a melhor forma de lidar com possíveis vazamentos.
Toda essa mudança tem uma única causa: um site de divulgação de dados sigilosos com base na Suíça cujo nome é WikiLeaks. Em funcionamento desde 2007 e chefiado pelo ativista Julian Assange, a página vinha causando furor desde meados deste ano, quando divulgou um vídeo exclusivo no qual dois jornalistas são assassinados de maneira equivocada, no Iraque, pelas forças armadas norte-americanas. Detalhe: a gravação pertencia ao próprio exército do país.
Questão delicada, obviamente. Mas talvez pouco perto do que aconteceu há algumas semanas, quando cerca de 250 mil documentos da diplomacia dos Estados Unidos foram divulgados, causando enorme constrangimento para o governo de várias nações, podendo criar problemas sérios no que diz respeito à política internacional.
No que se refere ao Brasil, há coisas interessantes, como o a revelação de que nossa Polícia Federal prende de maneira frequente pessoas ligadas ao terrorismo, mas que faz isso se utilizando de diferentes acusações para não chamar a atenção da imprensa ou mesmo de alguns escalões do governo. Informação disponibilizada, é bom ressaltar, pelo embaixador dos Estados Unidos em Brasília. Outros documentos mostram ainda o que pensa a diplomacia norte-americana sobre o governo brasileiro: atravessado pela corrupção, defensor de posições polêmicas no que diz respeito ao Irã e com um enorme sentimento antiamericano.
Informações delicadas, sim, mas nada perto do que foi divulgado, por exemplo, quanto à presença de armamento norte-americano em países europeus. Holandeses, belgas e alemães ficaram sabendo, por conta dos documentos secretos revelados e não pelo governo de seus países, que os Estados Unidos mantêm armas nucleares em seus territórios. Estas informações se encontravam em despachos feitos pelo embaixador americano em Berlim, Philip Murphy, nos quais discutia negociações sobre a possível retirada dessas armas de tais territórios. É de se esperar que tal divulgação inicie imediatamente uma discussão interna nesses países, com possível estabelecimento de crises entre governos e população.
Há documentos que vieram à tona e que, inclusive, mostram que diplomatas dos Estados Unidos negociaram de maneira um tanto quanto absurda com outros países a realocação de alguns prisioneiros de Guantánamo. Se a Eslovênia, por exemplo, quisesse um encontro com o presidente Obama, teria que abrigar um prisioneiro em seu país.
A divulgação dos documentos sigilosos por parte do WikiLeaks vem abrindo certas discussões a respeito do papel e dos limites da imprensa. Teria um site o direito de desestabilizar relações internas e internacionais de algumas nações por conta de um outro direito: a da liberdade de informar? Por que os dados se referem apenas ao governo dos Estados Unidos, que ficaria em uma posição de enorme desvantagem diplomática em relação a outros países?
O certo é que um dos maiores servidores norte-americanos impediu que seus usuários acessassem a página do WikiLeaks a pedido do governo do país. Detalhe: tal ação desrespeitaria a bastante aclamada primeira emenda da Constituição dos Estados Unidos que diz respeito à liberdade de expressão. Sem dúvida um marco de instalação de um problema complexo demais, centrado, pois, nos já tocados direito de sigilo e de divulgação.